quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Velha senhora - parte 3

--- E então? -- ela perguntou. -- Quer saber como eu sei?
Tomávamos o chá em silêncio e eu buscava desesperadamente um modo de ir embora sem parecer grosseiro. Eu estava realmente desconfortável e não queria mais saber deste assunto. Mas a velha insistia.
--- Quer saber como eu sei que o ovo da fênix é vermelho e duro e frio como uma pedra?
Tive receio de olhar para ela; sabia que ela estaria sorrindo. Imaginei que talvez ela farejasse meu medo e confusão como certos animais. Fiz que sim lentamente com a cabeça.
--- Ótimo, eu sabia que sim -- deu um tapinha satisfeito nos joelhos. -- Vamos -- disse, pondo-se de pé.
Olhei para ela aturdido.
--- Onde? -- perguntei.
--- Ver o ovo da fênix.
Incapaz de desobedecer, me levantei em silêncio e a segui. A velha me conduziu por um corredor decorado com quadros mostrando os mais diversos tipos de aves e que me pareceu mais comprido do que o pequeno apartamento fazia supor. Comecei a sentir um cheiro de queimado que crescia conforme avançavamos em direção ao final do corredor. Junto com o cheiro me atacou uma forte dor de cabeça que parecia também aumentar a cada passo. Os estranhos pássaros nas pinturas pareciam me fitar com curiosidade. Ao final, em um nicho na parede, um pequeno pássaro empalhado me encarava com ar feroz. Em frente ao nicho havia uma porta fechada com várias trancas. O cheiro de queimado era intenso e percebi que vinha do quarto fechado. Minha cabeça latejava e senti a boca seca. A velha senhora virou-se pra mim e sorriu mais uma vez. Sem dizer palavra, sacou um molho de chaves e abriu as trancas da porta, uma por uma. Tentei lhe dizer que tinha desistido, que não queria mais ver nada, mas minha voz não saía. Eu suava, estava muito quente agora, e a dor me atordoava. Quando ela abriu a última tranca, a porta se escancarou. O quarto estava em chamas, o fogo cobria tudo, e em um canto estava um pequeno pássaro vermelho. Digo vermelho porque foi a cor que vi, na verdade parecia que o próprio pássaro era feito de fogo. O pássaro virou-se na direção da porta e seus olhos negros pousaram em mim e na velha. Então, abriu as asas que estavam cobertas de chamas, eram como que feitas de chamas, e voou na direção da porta, na nossa direção. Com o vôo as chamas do quarto se agitaram. Uma grande lufada de ar incrivelmente quente me atingiu e por alguns segundos foi impossível manter meus olhos abertos. Ainda de olhos fechados consegui cambalear de volta a sala, minha cabeça doía e pequenos círculos vermelhos e verdes dançavam em frente aos meus olhos, mesmo fechados. Me joguei no sofá e caí desmaiado.
Não sei por quanto tempo fiquei desacordado. Quando recobrei os sentidos, o cheiro de queimado vinha ainda forte do fundo do corredor. Olhei em volta à procura da velha, mas eu estava sozinho na sala. Segui cauteloso pelo corredor até o últmo quarto. O calor ali era intenso, a um canto vi o que parecia um corpo deformado pelo fogo. Imaginei que seria a velha. No centro do quarto, uma pequena pedra vermelha parecia intacta em meio à confusão de cinzas e carvão. Toquei-a com a ponta do sapato, sentindo o sapato em seguida com a mão: a pedra estava fria. Peguei-a com cuidado e a guardei no bolso.

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