quarta-feira, janeiro 09, 2008

Velha senhora - parte 2

--- Quer saber como eu sei? -- ela havia dito. -- Como eu sei que o ovo da fênix é vermelho e frio?
É claro que eu quis. Como eu disse, já havia sido fisgado. Como em um sonho, a segui até sua casa.
--- Vou te mostrar -- ela havia dito.
O apartamento era pequeno. Pensando melhor, não era pequeno, apenas era muito menor do que deveria ser para acomodar todos os móveis e cortinas, quadros e porta-retratos, badulaques e abajures e tapetes. Um apartamento que dizia que seu dono se vira forçado a descer de padrão de vida mas não quis se desfazer de nada. Apenas desmontou o apartamento anterior e o remontou em um com talvez metade do tamanho do original.
--- Chá?
Tive um sobressalto. Estava tão absorto olhando em volta que me esqueci da velha. Parada pouco atrás de mim, ela aparentemente supervisionava minha inspeção da sua sala.
--- Chá? -- repetiu. A velha sorria, parecia satisfeita. Pensei que devia ser solitária. Será que tinha filhos, netos?
--- Pode ser, obrigado -- respondi.
--- Sente-se, fique à vontade -- ela apontou uma poltrona com uma almofadinha bordada. -- Vou esquentar a água -- acrescentou, dirigindo-se para dentro da casa.
Pouco depois voltou trazendo uma bandeija com duas xícaras e uma compoteira de cristal com biscoitos.
--- Biscoitos amanteigados de Petrópolis -- anunciou. -- Aceita um?
Aceitei e ela saiu de novo, retornando em seguida com uma caixa cheia de saquinhos de chá.
--- Qual sabor prefere?
Em tudo a velha senhora era uma perfeita anfitriã. Educação à moda antiga, pensei.
--- Chá preto -- respondi.
Retirou dois saquinhos da caixa, deixando-os na bandeija e sumiu de novo na cozinha. Comecei a procurar uma desculpa para ir embora. Era claro que a estória do ovo da fênix tinha sido uma isca. Uma senhora carente buscando companhia. Resolvi que tomaria o chá e me despediria dizendo que tinha um relatório para terminar, o que não era nenhuma mentira.
Ela voltou trazendo um bule de chá com água quente que despejou nas duas xícaras. A xícara era tão fina que fiquei com medo de quebrá-la e o próprio bule parecia de prata. Minha avó tinha três tipos de louça: a do diário, a de visitas e a de visitas de cerimônia. Estava claro que a velha senhora usava comigo o terceiro tipo de louça. Comecei a sentir que havia algo estranho. Será que ela não tinha receio de levar desconhecidos para casa? E se eu fosse um ladrão? Olhei-a de esguelha. Ela retribuiu meu olhar com um sorriso. Tive um calafrio. Um mau pressentimento começava a se apoderar de mim.

Um comentário:

Anônimo disse...
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