sábado, dezembro 08, 2007

Cuidado: Frágil

Ele pensou que ia ser fácil. "Fácil, fácil" pensou. "Molezinha, canja de galinha" pensou, e riu porque lembrou da infância, do "é canja, é canja, é canja de galinha, arranja outro time pra jogar na nossa linha!" E ele sempre na torcida com as meninas, nunca jogando. "Você tem a saúde frágil" a mãe dizia, "não pode fazer esforço." Porque ele teve pneumonia quando era pequeno, quase morreu. Ele não se sentia frágil, na verdade não, mas sempre tinha medo que um esforço maior o matasse. E quando ele fazia alguma coisa, digamos, alguma atividade física, e ele sempre fazia atividades físicas, ainda que não jogasse futebol com os garotos, quando fazia e seu coração disparava a bater rápido, tão rápido e ele ficava com medo que parasse. Sempre imaginava que ia parar e ele ia morrer e a mãe ia descobrir e dizer "mas eu não disse que você não podia fazer esforço, atividade física!" e a mãe ia chorar até ficar com os olhos inchados e o nariz vermelho, que nem quando a avó dele morreu.

Olhou mais uma vez em volta. Ninguém, tudo parado. Abriu devagar a janela. Passou uma perna, depois a outra. De um pulo estava dentro da casa. Encostou a janela e acendeu a lanterna. Sabia onde ficava o cofre, até a combinação o burro tinha dito a ele. Burro. Pé ante pé seguiu até o escritório e nem precisava de tanto cuidado; o velho estava na Europa e ainda disse que trazia um vinho pra ele. "Vinho bom, não é essa porcaria que você bebe." E ele riu. Pegou tudo que achou no cofre e pôs na mochila, até uns papéis que deviam ser ações, sei lá, gente rica tem sempre ações. Saiu como entrou, tomando o cuidado de não mexer em mais nada. Saiu e desatou a correr. O coração acelerado da corrida e ele ofegando, correndo e rindo. "Frágil nada."

Um comentário:

Nina Zambiassi. disse...
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